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Residências no Setor Comercial Sul: A Polêmica Revitalização Urbana que o GDF quer fazer em Brasília

Faz uns dias que o Governo do Distrito Federal anunciou uma proposta que desagradou e agradou muita gente ao mesmo tempo: Permitir o uso Residencial no Setor Comercial Sul.

Para quem não é muito familiarizado com a cidade, e que não entende a importância dessa notícia, vamos esclarecer alguns fatos:


  • Brasília foi concebida por Lúcio Costa (e não por Oscar Niemeyer como muitos acreditam)

  • Brasília não foi inspirada em um avião!

  • O projeto foi resultado de um Concurso, onde a proposta vencedora foi a de Lúcio Costa (conheça as outras propostas para Brasília)

  • Brasília foi concebida seguindo a corrente racionalista, movimento arquitetônico/urbanístico defendida pelo arquiteto suíço Le Corbusier, o qual era muito próximo tanto de Lúcio Costa quanto de Oscar Niemeyer

  • A corrente racionalista defendia um rígido zoneamento e setorização das cidades, portanto, Brasília foi dividida em zonas, ou seja, zona residencial, zona cívica, zona comercial, zona industrial, zona hospitalar etc

  • O Setor Comercial Sul é uma dessas zonas

  • Brasília tornou-se Patrimônio Cultural Mundial em 1987 pela UNESCO

  • Apesar de sua romântica saga e de seu projeto totalmente inovador para a época, Brasília tem sofrido diversas críticas de consagrados especialistas em urbanização, críticas estas que não tem sido muito aceitas pelos teóricos defensores de Brasília e do Modernismo


Brasília: Estrutura de 60, Problemas de 460


Brasília foi construída em quatro anos, sendo inaugurada no dia 21 de abril de 1960. Em apenas 59 anos já possui problemas como a cidade de São Paulo, por exemplo, com sete vezes a sua idade.


  • O trânsito é o pior deles. Há 10 anos atrás, Brasília só apresentava engarrafamento nos horários de pico, nesses últimos anos, enfrenta-se engarrafamento em quase todas as vias da cidade. E não para por aí, Brasília tem um dos 10 piores sistemas de transporte público do mundo.

  • Também sofremos com invasões de áreas de preservação, invasão de área pública e ocupação habitacional irregular. O crescimento desordenado e o aumento da população já estão provocando problemas de abastecimento, poluição e assoreamento em Brasília. Isto tudo é originado pela crise habitacional no DF. O Distrito Federal é a região que mais cresceu demograficamente nos últimos 10 anos no país. Esse aumento populacional exige mais áreas de habitação. Como o Governo do DF resolveu dormir por vinte anos, as áreas então rurais do DF foram se desmembrando e se transformando em condomínios irregulares. Muitos deles cresceram em áreas de preservação ambiental permanente, cujos solos são responsáveis por abastecer aos lençóis freáticos, que por conseguinte abastecem as bacias hidrográficas do DF, que alimentam os leitos dos rios que cruzam a região, que oferecem a água para os moradores do DF. E o solo dessas áreas foram totalmente impermeabilizados, muitas das nascentes e córregos foram soterrados, lençóis foram não só drenados (pois essas áreas não possuiam infraestrutura de abastecimento de água, e os moradores abriram poços artesianos) como também contaminados (pois as fossas sépticas não atendiam às normas sanitárias), o que acabou secando as bacias, que secaram os rios, que prejudicaram o abastecimento de água do DF (entendeu agora de onde vem a nossa crise hídrica?).

  • Apresentamos a maior desigualdade de renda do país.

  • Também temos problemas estruturais em pontos críticos da cidade, viadutos, pontes e a rodoviária, por exemplo, que estão se deteriorando a ponto de serem interditados.

  • Temos também a maior favela da América Latina

  • Até 2018 tínhamos o maior lixão da América Latina e o segundo maior do mundo.

  • Quanto à violência, há aqueles que dizem que os dados da violência em Brasília são mascarados, e outros explicam que nem todos os crimes em Brasília são registrados com o Boletim de Ocorrência pelas vítimas, o que acaba influenciando nas estatísticas. Com os dados registrados, somos o décimo primeiro no país em crimes contra patrimônio (roubos e furtos, lembrando que nem todas as vítimas desse tipo de crime fazem o Boletim de Ocorrência), e esta realidade ainda pode piorar, com a vinda dos chefes das grades facções para o Presídio Federal de Brasília.

  • Outro problema comum em Brasília é a instabilidade do comércio. Nesta crise recente, Brasília apresentou o pior desempenho do país no comércio. E a recuperação não parece estar chegando. A cidade também sofre com um fenômeno que é a falta de continuidade de muitos estabelecimentos comerciais. É comum em Brasília ouvirmos dizer que tal loja fechou, tal restaurante fechou. Não temos estabelecimentos tradicionais em Brasília, a vida útil do comércio na cidade é muito curta, e aqui já estamos acostumados com esse abre-e-fecha comercial.

Com tantos problemas em tão pouco tempo, é de se perguntar quantos anos Brasília ainda resistirá?


Brasília: Cidade mal Planejada ou má Gestão?


Dá até medo dizer isto. Dizer que Brasília foi mal planejada é provocar a ira de diversos estudiosos e teóricos (e outros muitos, muitos leigos) aficcionados pelo audacioso projeto do Lúcio Costa e por tudo o que o modernismo/progressismo representa. Bem que dizem que o amor é cego. É muito triste pensar que, uma cidade que teria tudo para dar certo, sofre parada no tempo por causa de meia dúzia de pessoas que querem que ela permaneça intocada (não só as partes boas, mas principalmente, as partes ruins da cidade) e emaculada.


Por muitos anos eu, como arquiteta e urbanista, e moradora de Brasília, imaginava que o que causava esses problemas da cidade era simplesmente a má gestão. Ora, nós conhecemos os políticos que temos, não é novidade que nenhum deles sabem - ou têm a intenção - gerir bem alguma coisa (que não as suas próprias contas bancárias) mas, ultimamente, em minha pesquisa sobre comportamento, neurosciência e psicologia aplicada à arquitetura e ao design, comecei a questionar se todos esses problemas são realmente, simplesmente causados, pela má gestão.


O Trânsito e a População Flutuante


Eu não queria me demorar muito sobre esse assunto (até porque o cerne do texto é sobre uma região específica), mas este ponto é crucial para entender o problema da setorização de Brasília. E a questão é tão simples que uma criança de 5 anos consegue compreender.


Imagine que você mora em uma zona residencial, onde só existem edifícios de apartamentos. E 70%, pelo menos, das pessoas que moram nesses edifícios, vão sair de casa no mesmo horário, para se deslocarem para os mesmos lugares: deixar o filho na escola (ou ir para a faculdade) e/ou ir para o trabalho, que muito provavelmente está localizado no centro cívico ou comercial da cidade que, inclusive, estão localizados na mesma região.


Você consegue imaginar a quantidade de pessoas se deslocando dessas áreas para as mesmas zonas centrais? A quantidade de carros nas ruas? A quantidade de veículos de transporte público necessários? E pensar que essas áreas distam, no mínimo, cinco quilômetros da zona cívica, que faz com que ninguém consiga ir a pé para o trabalho?


O censo mais recente calcula que o Plano Piloto possui 220.393 habitantes, entretanto, ele possui uma população flutuante de quase um milhão de pessoas, que são aquelas que nãoresidem no Plano Piloto, e que tem que se deslocar de suas casas, todos os dias, para virem trabalhar no centro de Brasília, sendo que a cidade foi planejada para uma lotação máxima de, aproximadamente, 600.000 pessoas. Realidade bem distante do planejado, hein?


O alto custo das zonas mortas da cidade...


Após a jornada diária de oito horas, o mesmo deslocamento massivo de pessoas das zonas comerciais, cívicas etc, inverte-se para as zonas residenciais e para as cidades satélites. E outro fenômeno acontece: a morte da região central de Brasília. Até mesmo a Esplanada dos Ministérios, com suas luzes e edifícios icônicos, fica vazia e abandonada no fim do dia. Esplanada, Setor Comecial Sul e Norte, Setor de Autarquias Sul e Norte, Setor Bancário Sul e Norte, Galerias, Setor Hoteleiro Sul e Norte, Conic, Conjunto Nacional, Torre de TV, Museu JK, Teatro Nacional, Catedral, Rodoviária... todas essas regiões e edifícios importantes e turísticos, na capital do país, ficam abandonados, sozinhos e inutilizadosdas 18h às 8h do dia seguinte (para sermos mais justos, das 20h às 6h).


São quilômetros quadrados, com vias, calçadas, áreas verdes, praças inutilizados. São galerias de águas pluviais, infraestrutura de saneamento e abastecimento de água, postes de luz e telefonia, além dos inúmeros edifícios (que consomem todos esses recursos e serviço) tudo isso fica abandonado por, pelo menos, dez horas por dia (isto durante a semana, pois aos fins de semana podemos aumentar para vinte e quatro horas).


Quanto custa, para o nosso planeta, um metro quadrado de área urbana? Quanto se desmata, se polui, se desperdiça, para termos um metro quadrado de uma cidade construída? Será que vale a pena, não apenas em termos ambientais, mas em termos econômicos, termos zonas totalmente mortas nas cidades, que só são utilizadas durante dez horas por dia?


O problema não é somente o custo ambiental e econômico dessas áreas, mas o abandono atrai o que não presta. Esses locais centrais e abandonados são um prato cheio para atividades ilícitas, práticas de crime, pontos de prostituição e consumo de drogas. Se tornam locais perigosos, com altos índices de furtos de veículos, assaltos à pedestres, e logo começam as atividades de tráfico de drogas em plena luz do dia, que então atraem os usuários, que viram pedintes e vigias de carro. E logo o local começa a abrigar criminosos foragidos, os estacionamentos viram locais para esfriar veículos roubados, esconder entorpecentes. E os crimes começam a piorar, viram homicídios (geralmente cometidos por disputa de pontos de venda de drogas ou crimes entre moradores de rua), latrocínios, estupros (pois as áreas abandonadas e escuras são locais muito usados para este tipo de crime).


E a área, que antes era bem movimentada durante o dia, começa a afastar os clientes do comércio, logo logo os consumidores deixam de frequentar a região. E as lojas e as salas comerciais fecham, mudam-se. Milhares de lojas e salas estão vazias, proprietários de imóveis comerciais alugados entram em desespero, abaixam o aluguel o máximo que podem. Já vi anúncios de sala comercial no Setor Comecial Sul a partir de R$100 mensais. Outros ofereciam quase um ano de carência! E quanto mais o tempo passa, mais as pessoas evitam, mais o comércio morre, e o valor do metro quadrado da região despenca. E nessa hora, aqueles que não tem aonde morar aproveitam os preços baixos e começam a ocupar as salas.


O valor muito baixo dos imóveis não só atraem aqueles mais carentes, mas também atraem aqueles que estão às margens da lei. E o aluguel baixo, a baixa ocupação e a baixa renda força os condomínios a abandonarem suas manuteções. E logo os edifícios se transformam em cortiços e verdadeiras bombas-relógio: pois, sem a devida manutenção, não tardará muito, esses edifícios serão palco de desastres como o edifício Wilton Paes de Almeida, em São Paulo. E quando todos estes edifícios estiverem tomados por famílias carentes e moradores de rua? O que os estudiosos, teóricos e admiradores do projeto do Lúcio Costa vão sugerir para resolver o problema?


A Revitalização do Setor Comercial Sul e a Crise Habitacional no DF


Bom, agora que você entendeu sobre o problema da setorização, vamos voltar ao Setor Comecial Sul.


Temos uma área central na capital do país, totalmente urbanizada e provida de infraestrutura urbana (sistema de saneamento, abastecimento, escoamento, rede elétrica, pavimentação, sistema viário etc), mas que está completamente abandonada, com edifícios vazios, caindo aos pedaços, carentes de manutenção, alguns inclusive já sendo invadidos por moradores de rua, servindo de palco para crimes, tráfico e consumo de drogas, prostituição, abrigo de moradores de ruas, criminosos foragidos etc.


Mas então, como atraímos pessoas para um local em que elas não mais desejam frequentar? É aí que entra o segundo ponto mais importante da crise de Brasília: A crise habitacional. O DF foi a unidade da federação com maior crescimento populacional nos últimos anos, e esse tanto de gente precisa de lugar pra morar! Os defensores do modernismo-romântico (termo inventado por mim) querem que o centro de Brasília permaneça intocado, sem alterações, não querem novas moradias no Plano Piloto, e defendem que a cidade cresça somente no entorno, mas se esquecem que o centro-nervoso das atividades públicas e comerciais no Distrito Federal ainda é no centro de Brasília. Todas essas pessoas que moram no entorno ainda vem para o Plano Piloto, todos os dias, para trabalhar ou resolver outras questões.


A falta de interesse em desenvolver o sistema habitacional do DF e a vaidade em manter o projeto do Lúcio Costa intocado foi o que provocou todas as ocupações irregulares no Distrito Federal. Todas as áreas que antes eram destinadas a atividades rurais se transformaram em condomínios inacabáveis, que junto à elas foram surgindo vias e blocos comerciais desajeitados, que no final se transformaram em verdadeiros Frankesteins urbanos. E o problema não é só estético ou funcional, a crise hídrica, como vimos no início do texto, foi causada exatamente por conta desta ocupação desordenada, que acabou causando o desequilíbrio ambiental e os problemas no abastecimento hídrico de Brasília.


A crise habitacional é real, e é grave, se não começarmos a preparar a cidade para suportar o crescimento habitacional saudável pelos próximos anos, dificilmente Brasília conseguirá completar a mesma idade da cidade de São Paulo, por exemplo. Por todos esses motivos expostos acima, a única solução viável para atrair o movimento de pessoas para o Setor Comecial Sul e ajudar o centro da cidade a respirar seria permitir usos mistos nessa região.


A forma mais inteligente, eficiente e econômica de se ocupar, tanto um edifício quanto um bairro, é garantir o uso misto. Quanto mais usos forem permitidos em um edifício (claro que, separados de forma adequada), mais ocupação temos na edificação, mais fácil garantir sua manutenção, e mais saudável fica o entorno. Pense comigo: ao invés de um edifício de doze pavimentos totalmente abandonado, e se no térreo tivéssemos atividade comercial varejista, nos três primeiros pavimentos tivéssemos atividade comercial, corporativo, público ou lazer, e nos últimos nove pavimentos tivéssemos uso habitacional? Teríamos pessoas entrando e saindo o tempo todo da edificação.


O uso habitacional trás atividades muito interessantes para a região, como padarias, cafés, livrarias, escolas, creches, academias, minimercados, restaurantes, sorveterias, bancas, drogarias, agências bancárias. Também exige um mobiliário urbano ainda mais interessante, como praças, parquinhos, áreas verdes recreativas, ciclovias. Com o passar do tempo, o movimento intenso e saudável de pessoas (pessoas que vivem, que moram e que trabalham, ao invés de usuários de droga, marginais, traficantes, prostitutas etc) acabaria por revitalizando completamente o setor.


Pois quem mora em algum lugar (e paga por isso), qualquer que seja ele, quer que o seu bairro seja bem iluminado, seja acessível, seja seguro, quem compra um imóvel ou paga um aluguel quer que o seu edifício esteja sempre bem cuidado, limpo, manutenido, seguro, quem consome os produtos e serviços de uma determinada região, quer que eles sejam de boa qualidade, tenham variedade, bom custo-benefício. As pessoas são quem revitalizarão o Setor Comercial Sul, e não o Governo, ou a Política, ou as "atividades culturais" (existe um movimento na região que realiza performances artísticas no Setor Comercial Sul e que teme que essas performances acabem por causa da ocupação habitacional).


A pluralidade de atividade comercial na quadra gera um movimento intenso de pessoas, a pé. Essa variedade de edifícios próximos uns dos outros e o movimento intenso de pessoas, oferece três vantagens:


  • Reduz a sensação de distância, fazendo com que as pessoas se sintam mais encorajadas à percorrer longas distâncias à pé, pois ela acaba se distraindo ao longo da via

  • Garante o bom funcionamento do comércio, pois faz com que os comércios estejam sempre em evidência, e sejam sempre vistos por quem transita a pé pelas ruas (e, convenhamos, o comércio precisa de gente andando nas ruas, não de carros!)

  • Garante a a eficiência do transporte público, pois mantém o fluxo de passageiros entrando e saindo, barateando a viagem


Outra questão importante são as distâncias ideais percorridas nas cidades. Alguns especialistas em trânsito de pessoas tentam determinar algumas distâncias ideais percorríveispelos pedestres em uma cidade, eis algumas delas:


  • Nos Centros das Cidades, o ideal são 200 metros, até 400 metros é aceitável, e o máximo preferível são 800 metros

  • Viagens do dia-a-dia (de casa até o trabalho, de casa até a escola etc), o ideal são 500 metros, até 1000 metros é aceitável e o máximo preferível 2000 metros

  • E no restante dos locais, o ideal são 400 metros, até 800 metros aceitável e o máximo preferível são 1200 metros

  • Do local mais remoto até a parada de ônibus 400 metros no máximo

  • Do local mais remoto até a estação de metrô/trem 800 metros no máximo

  • Outras fontes sugerem caminhadas de 5 ou 10 minutos no máximo para irem de um ponto ao outro


O Setor Comercial Sul oferece a possibilidade de reduzir essas distâncias percorridas. Se for bem trabalhada a mistura dos usos, se alguns edifícios abandonados e em péssimo estado forem demolidos para dar lugar a outros tipos de edificações, também de uso misto, se a malha urbana for desenvolvida para favorecer o trânsito dos pedestres e a posição adequada dos blocos, teremos uma zona riquíssima em variedade funcional e cultural, onde seria tranquilamente possível alguém morar na região e ir andando a pé para o edifício onde trabalha, ou pegar um circular e descer até a Esplanada, por exemplo. Se essa mesma solução for aplicada no (também abandonado) Setor Bancário Sul, pode ser possível até mesmo uma pessoa que trabalhe em um dos Ministérios ou Anexos ir andando para o trabalho.


E quando se fala em uso misto, abrindo as portas para o uso habitacional, é importante não limitar os tamanhos das unidades habitacionais. A variedade de áreas em um mesmo edifício também mantém a funcionalidade da edificação e garante um melhor aproveitamento demográfico. Um mesmo edifício que tenha apartamentos de 1, 2, 3 e 4 quartos, por exemplo, consegue obter um aproveitamento demográfico muito mais saudável e equilibrado do que um edifício onde só tenham apartamentos enormes de 4 quartos (total desperdício de área construída) ou microapartamentos de 1 quarto (gerando uma sobrecarga demográfica).


As Cidades são das Pessoas, não dos carros!


Conclusão: As cidades são feitas para as pessoas, para os pedestres. O modernismo, no qual Brasília foi planejada, defendia que as máquinas iriam dominar o mundo, e que as cidades deveriam proporcionar espaços para os carros. Esse movimento acreditava na racionalização do habitar, e que a cidade era como uma máquina, com funções específicas (morar, trabalhar, lazer etc), e que essas funções deveriam ser separadas. E foi exatamente este pensamento que matou o movimento modernista: ignorar as pessoas e as suas necessidades básicas.


A neurociência e a psicologia tem estudado a relação entre o comportamento das pessoas e o meio físico em que elas vivem, ou seja, a relação humano-arquitetura. E em diversos desses estudos já foram apresentados resultados que demostram o quanto é importante proporcionar espaços construídos saudáveis, pois eles influenciam no comportamento das pessoas, no senso de comunidade, na simpatia (sim, as características do seu bairro influenciam se você vai ser mais simpático ou antipático; Se você mora em Brasília, provavelmente já deve ter ouvido alguém falar "as pessoas de Brasília são muito frias", isto não é mera coincidência!), a característica e a disposição dos edifícios influenciam na forma como as pessoas se sentem, se elas vão se sentir mais ansiosas, inseguras ou mais à vontade e abraçadas pela cidade...


Enfim, cada vez mais a ciência evolui para tentar ajudar os arquitetos e urbanistas a projetar e construir cidades e edifícios cada vez mais saudáveis para as pessoas, e seria um desperdício colossal (financeiro, espacial, ambiental, cultural etc) deixar de aproveitar os dados obtidos nesses estudos para usarmos em nossas cidades, simplesmente porque queremos defender uma ideia romântica de um determinado estilo arquitetônico, que falhou miseravelmente.


Priscila Bonifácio é arquiteta e urbanista com diploma reconhecido pela Universidade de Toronto, sócia e administradora do escritório IEZ Design, especialista em Reabilitação Sustentável Ambiental Arquitetônica e Urbanística pela UnB, tem certificação em Patrimônio Urbanístico de Brasília, pelo IPHAN, e é especialista em BIM, com 13 anos de experiência.

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